E se não tivesse existido a Torre de Babel?

A Torre de Babel esteve na base da destruição do tecido social da humanidade. Uma coisa mais profunda, portanto, do que a destruição da sociedade.


Essa destruição do tecido social acarretou um desfazimento mais radical do que a morte física de todas as pessoas que se dispersaram na explosão linguística e étnica.

Espírito Santo, Basílica do Rosário, Lourdes


















A dispersão teve como razão um pecado em que toda a humanidade de então se uniu para fazer um insulto a Deus: construir uma torre que chegasse até o céu numa emulação com o Criador.

A Torre de Babel foi a um símbolo no qual se exprimia uma vontade de revolta universal.

Se as nações tivessem sido fiéis ao plano divino, não teriam cometido esse pecado.

Provavelmente, os povos teriam se dilatado sobre a Terra como uma mancha de azeite na qual a mancha vai se espalhando, mas suas periferias conservam a continuidade em graus diversos com o centro, quer dizer, a unidade.

Teria assim sido possível uma língua, uma civilização e uma religião universal genuína, porquanto a revelação poderia ser conhecida por todos e transmitida com facilidade.

Mas, com o pecado da Torre de Babel, a possibilidade da expansão na união ficou impossível.

As nações tomaram rumos próprios, cada uma foi acrescentando à sua maneira de ser coisas que não podia comunicar à outra. Isso criou terreno fértil para um pulular de heresias desagregadoras, de culturas discordantes, de rivalidades de interesses, desentendimentos, inimizades e guerras.

A única exceção que conservou a harmonia foi o filão fiel que se perpetuou através de Abraão e no povo eleito.

O inimigo do gênero humano e os pecados dos homens retardaram essa obra.

A pretensão que Babel quis realizar no plano natural, a Revolução Protestante (1517) tentou recriá-la na Igreja. Quer dizer, erguer o orgulho humano até os Céus se atribuindo poderes para interpretar livremente a palavra de Deus e a Lei.

Esses poderes somente o Espírito Santo os tem, e Ele os concede a seus intérpretes legítimos, o Magistério e a Tradição da Igreja, que falam pela voz do Papa e dos bispos católicos.

Juízo Final, Fra Angelico
Juízo Final, Fra Angelico
Também desde a Revolução Francesa (1789), tenta-se a construção da sociedade humana fazendo abstração de Deus, de sua Igreja, extinguindo os governos que obedecem às suas Leis. A tábua dos Direitos Humanos foi instalada onde antes reinava a Tábua da Lei de Deus.

A Revolução Comunista (1917) e seus análogos de tipo socialista-nazista-fascista levaram essa revolta a ponto de quererem extirpar a própria ideia da existência de Deus.

Hoje, parece que a organização planetária “babélica”, feita contra Deus, chega até o céu. Porém, ao mesmo tempo, um pouco por toda parte dá estalos e seus construtores se entendem cada vez menos.

Entretanto, a obra regeneradora do catolicismo não cessa nunca. E no futuro – e desejamos que não seja longínquo – esse plano de Deus vai se realizar. 


Torre de Babel: as lendas pagãs, a ciência moderna e a Babel do Anticristo

 


Torre de Babel: as lendas pagãs,
a ciência moderna e a Babel do Anticristo

Uma Torre que atingisse os céus feita sem necessidade de Deus:  um pecado coletivo de revolta. Joos De Momper o Jovem (1564–1635)
Uma Torre que atingisse os céus feita sem necessidade de Deus:
um pecado coletivo de revolta. Joos De Momper o Jovem (1564–1635)











Referências à Torre de Babel perduraram nos mais diversos povos espalhados na Terra, testemunhando sua existência e o fato de ter sido a causa da confusão das línguas.

O mito de Enmerkar, dos sumérios (povo já desaparecido) fala da construção de um imenso zigurat (torre-templo) na origem da diversificação das línguas.

O missionário dominicano Frei Diego Durán (1537–1588) recolheu em Xelhua (México) a saga dos gigantes que tentaram construir uma pirâmide para atingir os céus, mas que os deuses destruíram, confundindo a linguagem dos construtores.

O religioso ouviu essa narração de um antigo sacerdote pagão de Cholula, pouco depois da conquista espanhola do México.

O historiador nativo Fernando d'Alva Ixtilxochitl (1565-1648) recolheu a lenda tolteca (América Central) segundo a qual após um grande dilúvio os homens erigiram uma imensa torre que os preservaria de outro dilúvio, porém suas línguas foram confundidas e eles se dispersaram pelas diversas regiões da Terra.

Um mito grego fala que o deus Hermes confundiu as línguas.

Histórias mais ou menos parecidas foram documentadas pelo antropólogo social escocês Sir James George Frazer (1854 – 1941).

Frazer menciona especificamente narrações nesse sentido entre os Wasania de Quênia; no povo Kacha Naga do Assam (Índia); entre os habitantes de Encounter Bay, Austrália; nos Maidu da Califórnia; nos Tlingit da Alaska e nos K'iche' Maya da Guatemala. Também entre os estonianos no Mar Báltico, Europa do Norte; e até na Arizona, EUA.

Que altura teve a Torre?

Em verdade, não se sabe com certeza qual era a altura da Torre no momento da dispersão. Apenas sabemos pela placa de Nabucodonosor que ela não chegou a ser concluída.

As ruínas do zigurat de Choghazanbil podem dar certa ideia da estrutura da Torre de Babel.
As ruínas do zigurat de Choghazanbil podem dar certa ideia da estrutura da Torre de Babel.
O apócrifo Livro dos Jubileus refere-se à Torre da maldição como tendo 5.433 cúbicos e dois palmos de altura (2.484 metros). Isto equivaleria a quatro vezes as estruturas mais altas da história humana.

Tal afirmação, porém, é tida como mítica por muitos estudiosos, que custam acreditar que os construtores de tempos tão antigos pudessem edificar uma estrutura de quase 2,5 quilômetros de altura.

Uma fonte extra-canônica, o Terceiro Apocalipse de Baruch, menciona que a 'torre da discórdia' alcançava 463 cúbitos (212 metros de altura).

Ou seja, mais alta do que qualquer outra estrutura do mundo antigo, como a Pirâmide de Quéops, no Egito.

Teria sido a estrutura mais elevada do que qualquer outra na história humana até a Torre Eiffel, montada em 1889. Compreende-se o impacto que produziu na Antiguidade. (Cfr. Wikipedia, Torre de Babel).

São Gregório de Tours (I, 6) escreveu em 594 d.C., citando o historiador Orosius (c. 417), que a Torre possuía “25 portas de cada lado, ou seja, 100 no total. As portas tinham uma dimensão assombrosa e eram de bronze fundido”.
 Dr. Linn W. Hobbs, professor de Ciência dos Materiais no Massachussets Institute of Technology – MIT, EUA, estudou a resistência dos tijolos usados no tempo da Torre de Babel.

Uso dos tijolos no templo de Ur
Uso dos tijolos no templo de Ur
Segundo as experiências de laboratório no MIT, o tijolo secado ao sol, portanto feito com a técnica comum da época, resistiria no máximo uma estrutura bem feita de 150 metros de altura.

Depois disso, racharia pelo próprio peso e o conjunto desabaria, caso o prédio tivesse forma de torre. Mas, se teve forma de pirâmide poderia ter ido até 450 metros, isto é, quase meio quilômetro.

Mas os construtores da Torre de Babel, segundo diz a Bíblia, conceberam tijolos especiais: “façamos tijolos e cozamo-los no fogo”. (Gen, 11, 3)

O mesmo Prof. Hobbs reproduziu a técnica e testou os tijolos especiais. Estes passavam um dia num forno a 800º C.

Eles suportariam uma construção piramidal de 3.200 metros de altura, dando base para a orgulhosa expressão referida pela Bíblia: “façamos para nós uma cidade e uma torre cujo cimo atinja os céus” (Gen, 11, 4)

Em seu livro “Structures, or why things don't fall down” (Pelican 1978–1984), o professor J.E. Gordon estudou o peso dos tijolos especiais e calculou sua resistência à compressão dos muros levantados.

Suas estimativas apontam que quando a construção – se feita em forma de torre reta – atingisse uma altura de 2,1 km, os tijolos da base não resistiriam e o prédio desmoronaria.

Porém, se tivesse forma piramidal, o prédio poderia atingir altitudes onde faltaria oxigênio para os construtores, antes mesmo de a Torre ruir pelo próprio peso.

Em qualquer caso, o fato de conhecerem técnicas para alcançar essas alturas não prova que chegaram até lá, mas sim que poderiam ter chegado.

As ruínas dos zigurats da Caldeia, as pirâmides do Egito, as próprias pirâmides dos maias e ainda de outros povos, sugerem que a Torre de Babel também teve forma piramidal.
O mais alto prédio hoje levantado é o Burj Khalifa, de 828 metros de altura, em Dubai.

Mas na China está sendo erguido o Sky City One, de 838 metros; há ainda, em fase de planejamento, a Azerbaijan Tower, de 1.050 metros, no sudoeste do Azerbaijão.
Aplica-se à Torre de Babel a descrição contida no capítulo 18 do Apocalipse. Mas isto é por analogia.

Essa descrição parece se referir ao orgulho dos homens do fim do mundo e seu desejo de construir uma imensa civilização materialista e laica que desafiaria insolentemente a Deus:
2. Clamou em alta voz, dizendo: Caiu, caiu Babilônia, a Grande. Tornou-se morada dos demônios, prisão dos espíritos imundos e das aves impuras e abomináveis,
3. porque todas as nações beberam do vinho da ira de sua luxúria, pecaram com ela os reis da terra e os mercadores da terra se enriqueceram com o excesso do seu luxo.
4. Ouvi outra voz do céu que dizia: Meu povo, sai de seu meio para que não participes de seus pecados e não tenhas parte nas suas pragas, 5. porque seus pecados se acumularam até o céu, e Deus se lembrou das suas injustiças. 6. Faze com ela o que fez (contigo), e retribui-lhe o dobro de seus malefícios; na taça que ela deu de beber, dá-lhe o dobro. 7. Na mesma proporção em que fez ostentação de luxo, dá-lhe em tormentos e prantos. Pois ela disse no seu coração: Estou no trono como rainha, e não viúva, e nunca conhecerei o luto. 8. Por isso, num só dia virão sobre ela as pragas: morte, pranto, fome. Ela será consumida pelo fogo, porque forte é o Senhor Deus que a condenou. 9. Hão de chorar e lamentar-se por sua causa os reis da terra que com ela se contaminaram e pecaram, quando avistarem a fumaça do seu incêndio. 10. Parados ao longe, de medo de seus tormentos, eles dirão: Ai, ai da grande cidade, Babilônia, cidade poderosa! Bastou um momento para tua execução! 11. Também os negociantes da terra choram e se lamentam a seu respeito, porque já não há ninguém que lhes compre os carregamentos: 12. carregamento de ouro e prata, pedras preciosas e pérolas, linho e púrpura, seda e escarlate, bem como de toda espécie de madeira odorífera, objetos de marfim e madeira preciosa; de bronze, ferro e mármore;13. de cinamomo e essência; de aromas, mirra e incenso; de vinho e óleo, de farinha e trigo, de animais de carga, ovelhas, cavalos e carros, escravos e outros homens. 14. Eis que o bom tempo de tuas paixões animalescas se escoou. Toda a magnificência e todo o brilho se apagaram, e jamais serão reencontrados. 15. Os mercadores destas coisas, que delas se enriqueceram, pararão ao longe, de medo de seus tormentos, e hão de chorar e lamentar-se, dizendo: 16. Ai, ai da grande cidade, que se revestia de linho, púrpura e escarlate, toda ornada de ouro, pedras preciosas e pérolas. 17. Num só momento toda essa riqueza foi devastada! Todos os pilotos e todos os navegantes, os marinheiros e todos os que trabalham no mar paravam ao longe 18. e exclamavam, ao ver a fumaça do incêndio: Que havia de comparável a essa grande cidade? 19. E lançavam pó sobre as cabeças, chorando e lamentando-se com estas palavras: Ai, ai da grande cidade, de cuja opulência se enriqueceram todos os que tinham navios no mar. Bastou um momento para ser arrasada! 20. Exulta sobre ela, ó céu; e também vós, santos, apóstolos e profetas, porque Deus julgou contra ela a vossa causa. 21. Então um anjo poderoso tomou uma pedra do tamanho de uma grande mó de moinho e lançou-a no mar, dizendo: Com tal ímpeto será precipitada Babilônia, a grande cidade, e jamais será encontrada. 22. Já não se ouvirá mais em ti o som dos citaristas, dos cantores, dos tocadores de flauta, de trombetas. Nem se encontrará em ti artífice algum de qualquer espécie. Não se ouvirá mais em ti o ruído do moinho, 23. não brilhará mais em ti a luz de lâmpada, não se ouvirá mais em ti a voz do esposo e da esposa; porque teus mercadores eram senhores do mundo, e todas as nações foram seduzidas por teus malefícios. 24. Foi em ti que se encontrou o sangue dos profetas e dos santos, como também de todos aqueles que foram imolados na terra. (Apocalipse, 18)
O texto apocalíptico não se refere à Torre de Babel primeira a não ser num sentido analógico ou simbólico.

A similitude de situações é a que convida os espíritos a ligar o texto do Gênesis ao do Apocalipse.

Muitos empreendimentos modernos eivados do espírito materialista que ignora ofensivamente a Deus podem ser também comparados às construções apontadas em ambos livros sagrados.

Sodoma: uma megalópole fastuosa que desapareceu de um modo sem precedentes

Sodoma: uma megalópole fastuosa que desapareceu de um modo sem precedentes

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Informações interessantes e um vídeo revelador
Tall el-Hammam reconstituição artística de como foi Sodoma.
Tall el-Hammam reconstituição artística de como foi Sodoma.

(Continuação do texto anterior: Desvendadas as ruínas de Sodoma)

Os trabalhos dos arqueólogos que acharam as ruínas de Sodoma estão concentrados em Tall el-Hamaam, na Jordânia. Gomorra estava localizada um pouco mais ao norte, também no vale do Jordão, perto do Mar Morto.

Na Bíblia, Sodoma é descrita rodeada de vegetação, bem irrigada, uma das maiores cidades ao leste do Jordão, cruzamento de rotas comerciais, e devido à sua riqueza e seu tamanho, pesadamente fortificada com torres e altas e largas muralhas.

A cidade que está sendo posta à luz corresponde a essa descrição. É a maior cidade desenterrada por cientistas na região, pois ela era maior entre cinco e dez vezes que qualquer vizinha.

O chefe da equipe de arqueólogos é o Dr. Steven Collins, professor de Arqueologia na Trinity Southwestern University, de Albuquerque, New Mexico, EUA. Segundo ele, tratou-se de uma cidade “monstruosa” – uma megalópole – se comparada com as outras da região no mesmo período histórico.

O Dr. Steven Collins sinaliza na foto aérea o local do achado.
O Dr. Steven Collins sinaliza na foto aérea o local do achado.

A equipe encontrou muralhas e defesas muito encorpadas, que incluem muros de 5,2 metros de largura e 10 metros de altura.

Foi possível identificar portas de ingresso, torres, postos de vigia, rondas e uma praça central que faziam parte do sistema defensivo.

“Foi uma empreitada enorme, explicou Collins, que requereu milhões de tijolos e grande número de pedreiros”, segundo noticiou o jornal britânico “Daily Mail”.

A cidade-estado foi sendo ampliada e fortificada constantemente, como evidenciam seus muros.

Na metade da Idade do Bronze, a muralha foi substituída por outra mais larga, com 7 metros de espessura, e que incluía uma espécie de anel viário que dava a volta na cidade.

Mas, além das concordâncias descritivas com a Sodoma da Bíblia, há outros dados mais desconcertantes e exclusivos da misteriosa cidade.

A destruição de Sodoma, segundo iluminura do século XIII. William de Brailes (1230 – 1260)
A destruição de Sodoma, segundo iluminura do século XIII.
William de Brailes (1230 – 1260)

Uma extinção repentina e singular

Tall el-Hamaam, a “Rainha do Sul do Vale do Jordão”, sumiu num brusco desastre final que engoliu Gomorra e numerosas pequenas cidades em torno dela.

Os restos do local evidenciam que a urbe estava em pleno apogeu no final da Idade do Bronze, quando teve um final repentino e catastrófico. A orgulhosa cidade tornou-se erma de um momento para outro, e ficou assim durante séculos.

Fragmentos de cerâmica recolhidos na jazida evidenciam que foram afetados por grandes temperaturas, maiores que as de um incêndio ou de um forno.

O fenômeno foi comparado ao verificado em cerâmicas recolhidas nos locais onde se fizeram testes com a bomba atômica, nos EUA.

O Dr. Collins destaca que sob todos os pontos de vista práticos, a cidade descoberta bate com a Sodoma da Bíblia.

Foi a maior cidade da fértil região de Kikkar. Mas, após um evento súbito e catastrófico, a luxuriante urbe virou um local abandonado durante mais de 700 anos.

Outra cidade cresceu no local durante a Idade do Ferro, entre os anos 1000 e 332 antes de Cristo, porém não teve relação com a anterior e também acabou sendo abandonada.

Os pesquisadores encontraram artefatos produzidos nessa Idade. Mas um silêncio estarrecedor de mais de sete séculos faz pensar que uma lembrança terrível afastava os homens de um local mal-assombrado.

Sodoma, o local das escavações.
Sodoma, o local das escavações.

Sodoma, o asteroide e o “Planisfério” de Nínive

O professor Collins diz não saber a causa da súbita desaparição de cidade tão grande e poderosa.

Em 2008, dois especialistas em foguetes – Alan Bond e Mark Hempsell – que tentavam decifrar uma tabuleta circular recuperada no século XIX na Mesopotâmia e conservada no British Museum, chegaram a uma sedutora conclusão.

Eles passaram oito anos nessa empreitada e, com a ajuda de computadores, puderam fixar a data em que tinha se dado a disposição das estrelas na tabuleta.

Por fim chegaram à conclusão de que a tabuleta foi obra de uma testemunha ocular da explosão de um asteroide sobre a região de Sodoma e Gomorra, na data aproximada em que elas desapareceram sob um dilúvio de fogo e enxofre, segundo a narração bíblica.

A tabuleta suméria conhecida como "Planisfério" e decifrada por Alan Bond e Mark Hempsell descreve um asteroide explodindo sobre a região de Sodoma e Gomorra.
A tabuleta suméria conhecida como “Planisfério”
e decifrada por Alan Bond e Mark Hempsell
descreve um asteroide explodindo
sobre a região de Sodoma e Gomorra.

Para os especialistas, um asteroide de 1,6 quilômetros de largura explodiu na região, provocando a morte de milhares de pessoas e devastando tudo numa superfície de mais de um milhão de quilômetros quadrados.

O impacto teria tido uma força 100 vezes mais poderosa que a maior bomba criada pelo homem, algo assim como mais de 20 bilhões de toneladas de TNT. Ele teria gerado um dos maiores desabamentos da história do mundo.

A tabuleta de barro é chamada de Planisfério, foi descoberta pelo arqueólogo britânico Henry Layard na época vitoriana, e faz parte da Biblioteca do Palácio Real de Nínive, conservada no British Museum.

Desvendadas as ruínas de Sodoma

Lições para o presente e para o futuro

Após décadas de escavações, uma equipe de arqueólogos tem certeza de que finalmente achou as ruínas de Sodoma, a cidade bíblica de espantosa memória, noticiou o jornal britânico “Daily Mail”.

A equipe de arqueólogos leva adiante o Tall el-Hammam Excavation Project.

O chefe da equipe é o Dr. Steven Collins, professor de Arqueologia na Trinity Southwestern University, de Albuquerque, New Mexico, EUA.

Os especialistas vinham cavoucando há muito tempo na localidade de Tall el-Hammam, no vale do Jordão (Jordânia), os restos de uma cidade de tamanho colossal da Idade do Bronze.

Segundo ele, tratou-se de uma cidade “monstruosa” – uma megalópole – se comparada com as outras da região no mesmo período histórico.

As peculiaridades das ruínas apontavam impressionantes analogias com a descrição que faz a Bíblia da cidade de Sodoma, destruída por Deus.

Os restos correspondiam à maior cidade da região, como também diz a Bíblia de Sodoma, e estão situados ao leste do rio Jordão, numa área verde perto do Mar Morto.

A cidade existiu entre os anos 3500 e 1540 antes de Cristo, data em que foi súbita e inexplicavelmente abandonada.

Sodoma e Gomorra nas Sagradas Escrituras

A destruição de Sodoma, junto com sua aliada Gomorra, está mencionada em numerosas partes do Antigo Testamento, inclusive no mais antigo livro que é o Gênesis. Mas também está referida no Novo Testamento.

O Antigo Testamento diz que Sodoma foi destruída pelo vício e pela homossexualidade que a tinham dominado.

“Os habitantes de Sodoma eram perversos, e grandes pecadores diante do Senhor”. (Gênesis 13, 13) Foi assim que, quando os dois anjos enviados por Deus entraram na casa de Lot: “os homens da cidade, os homens de Sodoma, se agruparam em torno da casa, desde os jovens até os velhos, toda a população. E chamaram Lot: ‘Onde estão, disseram-lhe, os homens que entraram esta noite em tua casa? Conduze-os a nós para que os conheçamos’. Saiu Lot a ter com eles no limiar da casa, fechou a porta atrás de si e disse-lhes: ‘Suplico-vos, meus irmãos, não cometais este crime’”. (Gen 19, 4-7).

Lot foge de Sodoma com suas filhas. Jan Harmensz. Muller (1571-1628)
Lot foge de Sodoma com suas filhas.
Jan Harmensz. Muller (1571-1628)

Mas a multidão, ávida de perversão, fez violência contra Lot e avançou para derrubar a porta de sua casa e se apoderar dos jovens.

Eles achavam que eram homens, mas na verdade eram anjos, que atingiram os homossexuais de cegueira. E a seguir anunciaram que destruiriam a cidade por ordem de Deus, e que Lot e sua família deviam partir naquela mesma noite. E assim só Lot e os seus se salvaram.

23. O sol levantava-se sobre a terra quando Lot entrou em Segor. 24. O Senhor fez então cair sobre Sodoma e Gomorra uma chuva de enxofre e de fogo, vinda do Senhor, do céu. 25. E destruiu essas cidades e toda a planície, assim como todos os habitantes das cidades e a vegetação do solo. 26. A mulher de Lot, tendo olhado para trás, transformou-se numa coluna de sal. 27. Abraão levantou-se muito cedo e foi ao lugar onde tinha estado antes com o Senhor.
28. Voltando os olhos para o lado de Sodoma e Gomorra e sobre toda a extensão da planície, viu subir da terra um fumo espesso como a fumaça de uma grande fornalha. 29. Quando Deus destruiu as cidades da planície, lembrou-se de Abraão e livrou Lot do flagelo com que destruiu as cidades onde ele habitava. (Gen 19, 23-29)

O episódio ficou como uma lição divina para a História. Sodoma e Gomorra (aliada de Sodoma na política e no vício) ficaram simbolizando a maldição e o repúdio de Deus aos pecados que bradam aos céus e pedem vingança.

Moisés, vitral da catedral de Edinburgo, Escócia.
Moisés, vitral da catedral de Edinburgo, Escócia.

Por isso Moisés, após abençoar Israel, amaldiçoou-o, se no futuro viesse a abandonar a fidelidade a Deus, relembrando o castigo de Sodoma e Gomorra:

“A geração vindoura, vossos filhos, que nascerem depois de vós, e o estrangeiro que vier de uma terra distante perguntarão, à vista dos flagelos e das calamidades com que o Senhor tiver afligido esta terra, à vista do enxofre e do sal, e deste solo abrasado, inculto e estéril, onde não cresce erva alguma – à semelhança da destruição de Sodoma e Gomorra de Adama e de Seboim, que o Senhor; devastou em sua cólera e em seu furor” (Deuteronômio 29, 23)

E sentindo-se já muito velho, Moisés entoou antes de morrer um cântico renovando as promessas ao povo eleito. E também as advertências divinas do que lhe aconteceria se prevaricasse:

“Suas videiras são das plantações de Sodoma e dos terrenos de Gomorra; suas uvas são venenosas, seus cachos, amargosos. o seu vinho é veneno de serpente, o mais terrível veneno de cobra! 34. Eis uma coisa que está guardada comigo, consignada nos meus segredos: 35. a mim me pertencem a vingança e as represálias, para o instante em que o seu pé resvalar. Porque está próximo o dia da sua ruína e o seu destino se precipita”. (Deuteronômio 32, 32-35)

Com fundamento em Moisés, o profeta Isaías increpou o povo de Israel, que se afastava da Lei:

“Ouvi a palavra do Senhor, príncipes de Sodoma; escuta a lição de nosso Deus, povo de Gomorra” (Isaías 1, 10)

E usou o exemplo das cidades malditas para profetizar o fim da cidade símbolo dos filhos da iniquidade, a Babilônia dos caldeus:

“Então Babilônia, a pérola dos reinos, a joia de que os caldeus tanto se orgulham, será destruída por Deus, como Sodoma e Gomorra”. (Isaías 13, 19)

Idêntica imagem empregou o profeta Jeremias contra a cidade de Jerusalém e seus sacerdotes que haviam abandonado hipocritamente a Lei:

“entre os profetas de Jerusalém vejo coisas hediondas: adultério e hipocrisia. Encorajam os maus, para que nenhum se converta da maldade. A meus olhos são todos iguais a Sodoma e seus congêneres semelhantes a Gomorra”. (Jeremias 23, 14)

Os Apóstolos se despendem de Nossa Senhora antes de ir evangelizar, Très Riches Heures du Duc de Berry, Folio 122v, Limbourg brothers (1385-1416)
Os Apóstolos se despedem de Nossa Senhora antes de ir evangelizar.
Très Riches Heures du Duc de Berry, Folio 122v,
Limbourg brothers (1385-1416)

E o mesmo Jeremias profetizou ameaçando a cidade pagã de Edom com a cólera com que Deus extinguiu Sodoma e Gomorra:

“Repetir-se-á a catástrofe de Sodoma e Gomorra, e das cidades vizinhas – oráculo do Senhor. Ninguém mais habitará lá e nenhum ser humano a povoará”. (Jeremias 49, 18)

No Novo Testamento, ao enviar os Apóstolos para pregar a Boa Nova e disseminar o Evangelho, Nosso Senhor Jesus Cristo advertiu aqueles que os recusassem, dizendo:

“Se não vos receberem e não ouvirem vossas palavras, quando sairdes daquela casa ou daquela cidade, sacudi até mesmo o pó de vossos pés. Em verdade vos digo: no dia do juízo haverá mais indulgência com Sodoma e Gomorra que com aquela cidade. (São Mateus 10, 14-15)

O Divino Mestre empregou boa parte de sua vida pública pregando sua doce palavra e fazendo alguns de seus mais maravilhosos milagres na cidade de Cafarnaum. Entretanto, observando a dureza dos corações, comparou o destino dessa cidade hoje em ruínas ao da própria Sodoma:

“E tu, Cafarnaum, serás elevada até o céu? Não! Serás atirada até o inferno! Porque, se Sodoma tivesse visto os milagres que foram feitos dentro dos teus muros, subsistiria até este dia. Por isso te digo: no dia do juízo, haverá menor rigor para Sodoma do que para ti!” (São Mateus 11, 22-24) Também São Lucas 10, 12.

Mas o castigo de Sodoma ficou não só como um exemplo para o passado, mas também para o futuro. E, quiçá – por que não? – para os presentes dias.

Assim o dá a entender São Pedro, o Príncipe dos Apóstolos, em sua segunda Epístola:

“se condenou à destruição e reduziu à cinzas as cidades de Sodoma e Gomorra para servir de exemplo para os ímpios do porvir” (II São Pedro 2, 6)

E São Judas nos repete em sua Epístola o mesmo grave ensinamento. Assim, ele adverte os primeiros cristãos:

“certos homens ímpios se introduziram furtivamente entre nós, os quais desde muito tempo estão destinados para este julgamento; eles transformam em dissolução a graça de nosso Deus e negam Jesus Cristo, nosso único Mestre e Senhor”. (São Judas 1, 7-8)

Apocalipse: a destruição de Babilônia, prefigurada pela destruição de Sodoma. Tapeçaria de Angers, França.
Apocalipse: a destruição de Babilônia, prefigurada pela destruição de Sodoma.
Tapeçaria de Angers, França.

E lhes anuncia o terrível juízo de Deus sobre esses que se infiltram nas fileiras sagradas do cristianismo e praticam o homossexualismo:

“Da mesma forma Sodoma, Gomorra e as cidades circunvizinhas, que praticaram as mesmas impurezas e se entregaram a vícios contra a natureza, jazem lá como exemplo, sofrendo a pena do fogo eterno. Assim também estes homens, em seu louco desvario, contaminam igualmente a carne, desprezam a soberania e maldizem as glórias”. (São Judas 1, 7-8)

São João no Apocalipse apresenta Sodoma como prefigura espiritual da civilização antinatural que os homens construirão no fim dos tempos.

Nela, os dois enviados de Deus – Elias e Enoc, segundo conceituados exegetas – pregarão contra o anticristo, serão mortos e terão seus corpos expostos na praça pública:

“Seus cadáveres (jazerão) na rua da grande cidade que se chama espiritualmente Sodoma e Egito (onde o seu Senhor foi crucificado). (Apocalipse 11, 8)

Escavando o Sinai: Uma Abordagem Arqueológica de Êxodo 24:1-11

 Não basta simplesmente desenterrar um artefato, compará-lo com uma descrição textual e chegar a uma data. Nem é aceitável utilizar provas arqueológicas para confirmar acriticamente a historicidade de um texto. Escavar um texto – assim como escavar uma informação – requer controles adicionais.


Por Timothy Hogue
Professor de Bíblia Hebraica e Cultura e História Israelita Antiga
Universidade da Pensilvânia,
fevereiro de 2024

Relacionar as descobertas arqueológicas com o texto bíblico continua a ser um tema muito debatido tanto nos círculos acadêmicos quanto nos círculos populares. Uma caricatura um tanto injusta dos primeiros arqueólogos bíblicos os imagina com uma Bíblia em uma mão e uma espátula na outra, determinados a descobrir evidências físicas que confirmem a historicidade de um texto bíblico. É certo que ainda existem alguns neste campo que adotam mais ou menos esta abordagem. No entanto, o século XX testemunhou a transformação da arqueologia numa disciplina científica com rigorosos controlos metodológicos. Certas vertentes dos estudos bíblicos têm se aproximado de uma transformação semelhante, e eu sugeriria que – com restrições metodológicas cuidadosas – os dados arqueológicos podem fornecer um meio mais científico para analisar algumas partes da Bíblia, tanto no que diz respeito à datação textual quanto à análise literária. .

            Quero deixar claro desde o início deste ensaio que a aplicação de abordagens arqueológicas modernas aos textos bíblicos exige repensar a relação entre os dois. Mais importante ainda, defendo que a cultura material tem o potencial de nos dizer muito sobre o mundo por trás do texto bíblico. Ou seja, boas correspondências entre a cultura material retratada no texto bíblico e atestada no registo arqueológico proporcionam-nos uma janela para os contextos sociais e históricos em que esses textos foram escritos. A cultura material pode nos dizer muito menos sobre o mundo contido no texto. Assim, o método que descrevo abaixo visa compreender melhor as motivações sócio-históricas para a escrita e edição de textos. Contudo, a intenção de tal abordagem não é abordar questões de historicidade, e eu diria que não é adequada para o fazer.

A Bíblia e a Cultura Material

            Como devemos dar sentido às representações da cultura material em um texto? Abordei esta ampla questão metodológica em vários estudos, mais extensivamente no meu livro Os Dez Mandamentos: Monumentos de Memória, Crença e Interpretação (2023) . Correndo o risco de simplificar demais, sugiro que tenhamos aproximadamente três opções de como compreender a cultura material retratada em um texto:

  1. Alguns podem suspeitar que a cultura material retratada é inteiramente fabricada como parte de uma narrativa ficcional. Se acontecer de se alinhar com a cultura material real atestada no registo arqueológico, isso é acidental e não tem qualquer relação com a data do texto. Esta opção é largamente excluída por trabalhos recentes sobre a natureza da criatividade. Em vez de conceptualizar a criatividade como uma capacidade ilimitada de um indivíduo, esta investigação reconhece agora que a criatividade é co-constituída pelos indivíduos e pelos seus contextos sociais e materiais (cf. Glăveanu 2014) . Em outras palavras, mesmo coisas novas são sempre feitas a partir do que já está disponível. A criatividade literária é limitada pela cultura material que cerca o escritor.
  2. Outra opção é que a cultura material retratada corresponda ao cenário histórico do texto. Assim, embora possa nos informar sobre a data dos acontecimentos narrados, não pode necessariamente nos dizer quando um texto foi escrito. Esta opção ignora a literatura sobre memória cultural, que geralmente argumenta que o passado é sempre reimaginado em termos do presente (cf. Assmann 2011) . Além de cuidadosos registros históricos da arte ou de escavações arqueológicas, uma representação da cultura material que seja significativamente anterior ao escriba responsável é simplesmente impossível. Um escriba da Idade do Ferro, por exemplo, não poderia ter retratado com precisão a cultura material da Idade do Bronze. Poderiam, no entanto, retratar a Idade do Bronze em termos da cultura material da Idade do Ferro.
  3. Se levarmos a sério o trabalho sobre memória cultural e criatividade, então a cultura material retratada num texto deve alinhar-se com a cultura material contemporânea do escriba que o produz. Em outras palavras, a produção do texto depende do contexto social e físico do seu produtor. As representações da cultura material baseiam-se, portanto, sempre na cultura material contemporânea do escritor e, portanto, têm uma relação direta com a data do texto.

Então, podemos datar arqueologicamente um texto bíblico? A resposta é um sim qualificado. Esta abordagem baseia-se na observação de que as práticas textuais e a produção literária são aspectos da cultura material. Além disso, as práticas textuais e mesmo a criatividade literária estão emaranhadas e inextricáveis ​​da cultura material. Por mais ilimitada que possa parecer a criatividade, um escriba é, em última análise, limitado pelo seu contexto social e material. Ele pode imaginar algo novo, mas apenas combinando o que é familiar de maneiras novas. Como disse Qohelet, “não há nada de novo sob o sol”. Como tal, com algumas modificações necessárias, os textos e a literatura podem ser analisados ​​utilizando técnicas derivadas do estudo da cultura material.

          No entanto, as abordagens arqueológicas da Bíblia apresentam várias ressalvas. Primeiro, apenas algumas passagens beneficiarão desta abordagem; nem todo texto retrata a cultura material com detalhes suficientes para que uma abordagem arqueológica seja útil. Em segundo lugar, ao utilizar dados arqueológicos para datar um texto, geralmente terminaremos com um período amplo em vez de um reinado específico ou um conjunto de anos como por vezes preferem os estudiosos da Bíblia. Por fim, precisamos ter muito cuidado em nossa metodologia. Não basta simplesmente desenterrar um artefato, compará-lo com uma descrição textual e chegar a uma data. Nem é aceitável utilizar provas arqueológicas para confirmar acriticamente a historicidade de um texto. Escavar um texto – assim como escavar uma informação – requer controles adicionais. Nos parágrafos seguintes, descrevo brevemente minha abordagem.

          Primeiro, precisamos estabelecer a estratigrafia do texto. Isto pode ser conseguido usando vários métodos críticos. A crítica das fontes e a história da redação, por exemplo, podem ser reanalisadas como métodos bem estabelecidos de estratigrafia textual. Em meu próprio trabalho, combino os insights de tais métodos com os do discurso intrabíblico. Este último método aborda a história de um texto a partir da presença de marcadores editoriais conhecidos. Escrever e editar textos fazia parte da cultura material, portanto, se encontrarmos marcadores conhecidos da atividade editorial, estaremos bem situados para identificar estratos textuais de uma forma que esteja fundamentada na cultura material (Schniedewind 2010) . O trabalho de Bernard Levinson é especialmente notável a este respeito, porque ele identificou uma série de marcadores editoriais em textos bíblicos com base no uso de estratégias semelhantes na literatura cuneiforme (Levinson 2005, 2020) .

          A estratigrafia textual difere da estratigrafia arqueológica em um aspecto essencial. Os estratos nos Telles são geralmente depositados uns sobre os outros. Pode haver alguma contaminação entre as camadas, mas geralmente as camadas mais profundas são mais antigas que as mais rasas. O mesmo não acontece com os textos. Os textos podem ser editados através de breves glosas e inserções, através de substituições, através da adição de novas introduções ou conclusões, ou em combinação com outros textos. O resultado é uma composição na qual as camadas fluem livremente umas para as outras e, portanto, a estratigrafia textual é significativamente mais complicada do que uma camada sobre a outra. Contudo, uma vez estratificado um texto, podemos ter uma ideia geral da datação relativa de cada camada. As inserções serão geralmente mais recentes do que os textos em que são inseridas, por exemplo (a menos, é claro, que essas inserções sejam extraídas de textos pré-existentes).

          Depois de estabelecermos a estratigrafia de um texto, nosso próximo passo é analisar as representações da cultura material dentro de cada camada. Obviamente, devemos procurar os artefatos representados, mas também devemos prestar atenção às interações representadas com esses artefatos. Além disso, deveríamos estar atentos às práticas incorporadas de forma mais geral. Tais práticas também fazem parte da cultura material. Ambos os aspectos da cultura material – artefactos e práticas – precisam de ser cuidadosamente comparados com descobertas de outros lugares que tenham sido datadas com segurança. A cultura material mudou ao longo do tempo, pelo que a representação de artefactos e práticas atestadas pode dar-nos uma indicação da data de um texto. Isto funciona melhor se tivermos uma ampla gama de comparandos cuidadosamente datados. Com base nisso, podemos começar a periodizar os estratos de um texto. Darei corpo a este método com um exemplo – a instalação ritual no Sinai retratada em Êxodo 24.

Escavando o Sinai em Êxodo 24:1-11

            Começamos a escavar o Sinai em Êxodo 24:1-11 estabelecendo a estratigrafia do texto. Os comentaristas geralmente concordam que os vv. 1-2, 9-11 e vv. 3-8 representam camadas separadas, ambas mostrando sinais de transformação adicional (Childs 1974, 499–502) . Joel Baden argumenta que as duas últimas palavras do v. 11 pertencem à mesma camada dos vv. 3-8, e estou inclinado a concordar, dada a adequação entre a prática descrita no v. 11 e a cultura material nos vv. 3-8 (Baden 2012, 117) . Dentro desta camada, uma retomada repetitiva – “ele aspergiu o sangue” – coloca o v. 7 entre colchetes como uma inserção posterior, que Schniedewind argumenta ser um acréscimo deuteronomista. A retomada repetitiva é um típico marcador de escriba da atividade editorial, em que uma frase-chave é repetida para colocar entre colchetes o material recém-inserido (Schniedewind 2004, 125–26) . A outra camada também contém uma continuação repetitiva – “e eles viram a Deus” – colocando a maior parte dos vv. 10-11a, que Simeon Chavel identifica como uma interpolação posterior (Chavel 2012, 44) . Temos, portanto, pelo menos quatro estratos nesta curta passagem que podemos agora relativamente datar com base em aspectos da cultura material.

            Podemos calcular a data relativa de cada estrato com base inicialmente nas práticas dos escribas expostas em cada um. Primeiro, as retomadas repetitivas marcam as inserções posteriores, portanto podemos concluir que os v. 7 e vv. 10-11a são posteriores às camadas que as envolvem. Em segundo lugar, Childs sugere que os vv. 1-2, 9-11 foram adicionados como colchetes para cercar os vv. 3-8, e tal técnica seria consistente com o que Sara Milstein chama de revisão por introdução e conclusão – uma técnica que aparece frequentemente tanto na literatura bíblica como na literatura cuneiforme (Milstein 2016) . Os versículos 3-6, 8, 11b são, portanto, a parte mais antiga do texto, portanto, seguindo a convenção arqueológica em que os estratos mais profundos e mais antigos são numerados mais alto, eu rotulo este Estrato IV. O versículo 7 é uma inserção posterior, então vou chamá-lo de Estrato III. Os versículos 1-2, 9 são um quadro posterior em torno dos vv. 3-8, então eu rotulo esse Estrato II. E finalmente, vv. 10-11a são uma inserção posterior no Estrato II, por isso o rotulo de Estrato I. Para prosseguir com uma datação e análise mais específica destes, no entanto, devemos reunir todos os fragmentos de cultura material que pudermos de cada um desses estratos. Para efeitos deste ensaio, chamarei a atenção para três aspectos inter-relacionados da cultura material em particular: os artefactos de culto, a sua manipulação ritual e o pessoal que os manipula. Então , devemos comparar as descobertas em cada estrato com descobertas datadas com segurança de outros lugares.

            Em Êxodo 24:3-6, 8, 11b, encontramos uma variedade de artefatos de culto: maṣṣebot , um altar e tigelas. Destes, os maṣṣebot são os mais importantes. Estas pedras monolíticas – que eram utilizadas em rituais para gerar a presença divina – já eram usadas na Idade do Ferro I (1200 – 1000 a.C.) em Israel e talvez até bem antes. No entanto, eles foram rejeitados no final do século VIII e não eram mais considerados um apoio legítimo ao ritual israelita. Os paralelos mais importantes com o maṣṣebot do Sinai vêm de Tel Dan, que atesta mais maṣṣebot do que qualquer outro site. É o único local que se aproxima e ultrapassa o número de Êxodo 24 (Bloch-Smith 2015) . Esses maṣṣebot conduziam peregrinos pela cidade até o recinto do templo, onde encontramos outro paralelo à instalação do Sinai: um grande altar israelita. No mesmo contexto, foi descoberta uma tigela que Jonathan Greer teoriza ter sido usada para coletar e manipular sangue (Greer 2010) .

            O pessoal que manipula esses artefatos inclui Moisés e ne'arim (נערים, “jovens”), aqui aparentemente referindo-se a praticantes de rituais não especializados. A presença de pessoal de culto não especializado parece estar alinhada com o que sabemos sobre Tel Dan antes do século VIII (Greer 2013, 120–22) . O primeiro envolvimento com esses artefatos é a inscrição deles por Moisés. Pelo menos uma inscrição do século IX foi incorporada à instalação de Tel Dan, mas devemos também notar que o templo judaico em Tel Arad atestou dois maṣṣebot ao lado dos altares e um deles mostra sinais de ter sido inscrito. Também vale a pena notar que Êxodo 24:4, no seu contexto atual, implica fortemente que o que Moisés escreveu foram os Dez Mandamentos e o Código da Aliança dos capítulos anteriores. Como defendo extensivamente no meu livro, os Dez Mandamentos foram modelados em inscrições monumentais do Levante, tais como as que seriam encontradas nas instalações rituais da Idade do Ferro. David Wright argumentou de forma semelhante que o Código do Pacto foi modelado nos códigos legais da Mesopotâmia, que foram exibidos em estelas – artefatos semelhantes ao maṣṣebot (Wright 2009) . Além do ato de inscrição, os jovens oferecem sacrifícios no altar diante das estelas, e esses sacrifícios são posteriormente usados ​​em uma festa cerimonial (v. 11b). Moisés coleta o sangue dos sacrifícios nas tigelas, espalha um pouco dele no altar e o resto no povo, e dirige o povo em performances verbais estereotipadas - talvez como aquelas conhecidas por serem executadas em instalações monumentais semelhantes em Zincirli e Carchemish em os séculos IX e VIII. Tomadas em conjunto, estas características apontam para uma data do século X ao VIII para o Estrato IV, mas outros factores (mais importante ainda, a falta de inscrições hebraicas antes do século VIII) sugerem que devemos inclinar-nos para mais perto do extremo posterior desse espectro.

            Em Êxodo 24:7, o único artefato de culto presente é o sefer habberit (ספר הברית, “Inscrição da Aliança”) que Moisés lê em voz alta para o povo. Exatamente o mesmo artefato é mencionado no relato da reforma de Josias em 2 Reis 23 e em nenhum outro lugar. Conseqüentemente, Schniedewind argumenta que a inserção em Êxodo 24 foi contemporânea à composição de 2 Reis 23. Há algumas complexidades adicionais aqui, mas, portanto, proporei uma data josiânica para o v . a Aliança” provavelmente reflete a prática assíria do século VII de estabelecer alianças com seus vassalos por meio de tabuinhas inscritas (Frankena 1965; Levinson e Stackert 2012) . As pessoas respondem a este artefato no v. 7 usando uma performance verbal modelada – mas não idêntica – às performances do estrato anterior. Tais respostas verbais estereotipadas são atestadas em períodos anteriores, mas Melissa Ramos demonstrou recentemente que o século VII pode ter sido um período importante para a revisão de tais roteiros rituais no antigo Judá com base em modelos assírios (Ramos 2021) .

            Em Êxodo 24:1-2, 9-10a, não encontramos artefatos de culto para serem manipulados, mas encontramos alguns especialistas em rituais. Estes incluem Moisés, Arão, Nadabe, Abiú e os setenta anciãos de Israel. Além disso, este estrato deixa claro que este pessoal forma uma classe de elite separada do povo em geral, e que o acesso ao espaço sagrado depende da posição de cada um nesta hierarquia social. Somente Moisés tem acesso a Deus, mas outras elites podem subir a montanha. As pessoas, porém, estão proibidas de se aproximar. Tal estratificação ritual é atestada em Tel Dan, possivelmente já no século VIII (mas não antes). Esta estratificação é atestada em outros sítios levantinos – como Zincirli e Carchemish – começando no final do século VIII e parece representar uma mudança regional na prática ritual (Gilibert 2011, 128–31) . O final do século VIII é, portanto, o término ante quem para este estrato. Este estrato pode, portanto, sobrepor-se ao Estrato III , porque a cultura material representada sugere um intervalo simultâneo de datas (embora o estrato III seja mais específico). Outros métodos diferenciaram quase universalmente estes estratos, por isso manterei essa distinção. No entanto, estritamente falando, meu método não consegue distingui-los claramente. Talvez venham de mãos diferentes, trabalhando no mesmo período histórico. De qualquer forma, precisamos comparar o Estrato II com a inserção nos vv. 10b-11a para determinar seu término post quem.

            Em Êxodo 24:10b-11a, encontramos um novo conjunto de pessoal ritual – os 'aṣile bene yisra'el (אצילי בני ישראל, “os nobres israelitas”). Estas figuras contemplam – e este olhar deve ser interpretado como um ato ritual – um pavimento de lápis-lazúli sob os pés de Deus. Este estrato certamente é posterior aos vv. 1-2, 9-10a, com base na sua inserção nesse estrato. A datação mais específica deste estrato requer o recurso a múltiplas linhas de evidência. Mais importante ainda, a palavra para “nobres” aqui foi identificada como um empréstimo do aramaico imperial. O contato entre o aramaico imperial e o hebraico foi mais intenso durante o período persa. O pavimento de lápis-lazúli pode sugerir experiência com complexos monumentais mesopotâmicos – como o Portão de Ishtar na Babilônia – que se intensificou de forma semelhante no período persa e antes do período neobabilônico. Esta imagem tem mais em comum com a visão de um trono de lápis-lazúli em Ezequiel 1, sugerindo uma data neobabilônica ou posterior para o estrato em questão (Chavel 2012, 44) . Aparentemente, as comunidades dos períodos neobabilônico e/ou persa sentiram a necessidade de introduzir as suas próprias elites no ritual do Sinai, e assim acrescentaram esta inserção.

Chegamos assim à seguinte estratigrafia para Êxodo 24:1-11:

Mesa Hogue Êxodo 24.1-11

Essencialmente, a passagem apresenta um relato de um complexo ritual concebido para constituir uma comunidade através de sacrifícios, envolvimento com monumentos e festas. Isso foi inicialmente descrito nos vv. 3-6, 8, 11b de acordo com as práticas normativas de formação política no final do século X ao VIII aC. Este texto foi posteriormente editado por várias mãos para acompanhar as mudanças nas práticas rituais na região circundante. Em algum momento entre o final do século VIII e o início do século VI aC, um editor estratificou os praticantes de rituais no texto para melhor corresponder ao que era praticado atualmente em Israel e Judá. Durante este mesmo período, a “Inscrição da Aliança” de Josias foi introduzida no relato para refletir a nova mídia associada à celebração da aliança na época. Finalmente, os editores pós-monárquicos apresentaram às suas elites esta hierarquia, bem como uma nova compreensão do encontro com Deus no Sinai, baseada na sua experiência de tais instalações monumentais na Mesopotâmia.

            Como resultado da aplicação de dados e métodos arqueológicos a Êxodo 24:1-11 – uma passagem famosamente complicada – descobrimos que ela é de fato muito mais coerente do que parecia inicialmente. Representa fundamentalmente um complexo monumental destinado a constituir a comunidade israelita. Tal como os complexos monumentais na região circundante, novos artefactos e práticas foram anexados à Instalação do Sinai ao longo do tempo em resposta a várias circunstâncias sociais e históricas (Hogue 2022) . Cada uma dessas mudanças deixou sua marca em nossa passagem, que foi estrategicamente editada para corresponder ao discurso ritual da época contemporânea de cada editor, sobrepondo-se a um novo conjunto de artefatos, práticas e vestígios de pessoas. Assim, como os estratos de uma narrativa, estes estratos textuais contam-nos uma história – a história do texto. A cultura material em cada estrato revela o mundo por trás do texto – as configurações sociais dos diferentes escribas que o escreveram. Embora a descoberta de paralelos arqueológicos com a Instalação do Sinai não possa, evidentemente, confirmar a historicidade da passagem, eles servem como um poderoso lembrete de que a escrita da literatura bíblica aconteceu em contextos históricos específicos. Esses contextos podem informar a nossa compreensão dessa literatura e das suas motivações originais.