As Principais Interpretações do “Milênio” de Apocalipse 20

Um dos assuntos mais debatidos na academia teológica é a questão do milênio. Quando falamos em assuntos polêmicos o milênio é tão controverso quanto a predestinação. Muitos cristãos nunca ouviram falar do assunto, mas tenho certeza que todos têm uma visão dos acontecimentos futuros da igreja independente de saber distinguir uma da outra. Para melhor entender o assunto vamos explorar todas as vertentes do milênio, suas conseqüências e objeções para a igreja.

Primeiramente, temos que entender o que é o ‘Milênio”.
Milênio significa “mil anos” (do lat. Millennium, “mil anos”). O termo vem do livro de Apocalispe 20: 4-5, onde se diz que
 “viveram e reinaram com Cristo durante mil anos”. 
No mesmo capitulo nos versos 2-3 também lemos que um anjo desceu dos céus, agarrou o diabo “ e o prendeu por mil anos; lançou-o no abismo, fechou-o e pôs selo sobre ele, para que não mais enganasse as nações até se completarem os mil anos”.
Que passagem deveras complicada!

Quando tratamos sobre o final dos tempos o debate é inevitável, uma vez que não temos uma clareza doutrinaria como outros assuntos da bíblia.

Haverá um milênio literal na Terra após o retorno de Cristo, conforme pregam os pré-milenistas? 
Ou o milênio é apenas uma representação da presente era da igreja como defendem os amilenistas? 
Ou ainda o milênio seguirá um desenrolar gradativo e progressivo após uma era de conquistas por parte da igreja, o qual instaurará o Reino de Deus no mundo conforme creem os pós-milenaristas?

O presente estudo tem como objetivo estudar, analisar e tecer algumas considerações quanto aos 4 possíveis e principais interpretações do Apocalipse 20.1-6.

A não ser que você sofra de escatolofobia, isto é medo de estudar as ultimas coisas, eu lhe convido para se aprofundar em um assunto tão interessante, velho, atual e relevante para nós, a Igreja do Cordeiro.

1°) O Pré-milenista (clássico ou histórico):

O prefixo já da a entender a relação do termo com o episódio. O retorno de Cristo acorrerá antes do milênio. Essa interpretação é a mais antiga da historia do cristianismo, alguns a defendem desde os primeiros séculos. O pré milenismo histórico acredita que a era que estamos vivendo atualmente (a era da igreja) continuara e prolongará até que, com a proximidade do fim, venha sobre a terra um período de grande tribulação e sofrimento. Então, depois desse período de tribulação e sofrimentos no final da era da igreja, Cristo voltará á terra para estabelecer um Reino milenar. Quando o acontecimento se concretizar, os cristãos que já morreram serão então ressuscitados, terão seu corpo reunido ao espírito, e esses crentes reinarão com Cristo sobre a terra por mil anos.

Os interpretes pré-milenistas discordam entre si em alguns pontos de como será o ocorrido. Alguns acreditam que os mil anos sejam literais enquanto outros acreditam que os mil anos seja um longo período simbólico e gradativo.

Seja literal ou simbólico, os pré-milenistas defendem que Cristo reinará fisicamente presente sobre a terra e dominará toda a Terra com seu poder. Para aqueles que morreram em Cristo e para cristãos que estarão vivos no acontecimento, receberão o corpo glorificado da ressurreição e assim reinaram juntamente com Cristo na terra no período de mil anos. Para os que morreram sem Cristo estes aguardaram o juízo na segunda ressurreição, ou seja no dia do grande juízo.

Os pré-milenistas históricos defendem que ao termino dos mil anos satanás será solto para um breve momento de perseguição a igreja. Sem êxito na tribulação e na perseguição, Satanás então é derrotado por Cristo e lançado no fogo. Ao fim desse episódio os crentes entraram com Cristo em sua Glória para todo o sempre.



Alguns teólogos defensores do Pré-Milenismo

– Orígenes
– Tertuliano
– Charles Spurgeon
– George Lasd

Pré-Milenismo e as Alianças

Os pré–Milenistas entendem que a promessa da aliança abraâmica, que dava aos descendentes de Abraão a terra desde o rio do Egito até o rio Eufrates, jamais foi cumprida, mas será totalmente realizada durante o reino milenar (Gn 15.18). As promessas da aliança davídica também requerem o estabelecimento do Reino milenar para que sejam cumpridas (2 Sm 7:12-16).

O pré-milenarismo e a Bíblia

O pré-milenarismo tem grande respeito pelo que esta nas escrituras. Provavelmente, seria seguro afirmar que, quase sem exceção, os pré-milenaristas acreditam na inerrância da Bíblia.

A historia do pré-milenismo clássico

A interpretação pré-milenista clássica foi defendida nos primeiros séculos da história da igreja. Ainda que os detalhes cronológicos não fossem tão claros, a visão pré-milenista teve grande aceitação no período dos pais da igreja. O historiador da igreja Philip Schaff, resumiu isso da seguinte maneira: “ A questão mais intrigante da escatologia do período anteniceno é o quiliasmo proeminete, ou milenismo, crença no reino visível de Cristo em glória na Terra com os santos ressurretos durante mil anos, antes do julgamento e da ressurreição generalizada. Isso não foi, de fato, uma doutrina da igreja incorporada a nenhum credo ou forma de devoção, mas sim uma opinião de renomados professores grandemente aceita”. A esperança da volta de Cristo foi minada pelo união da Igreja e o Estado sob o governo de Constantino. Anos depois Agostinho reinterpretaria o conceito e a duração do milênio como vamos ver logo adiante.

2°) O Pré-Milenismo Dispensacionalistas:

Os pré-milenistas dispensacionalistas tem sua origem no pré-dispensacionalismo histórico. Assim como os históricos, os dispensacionalistas acreditam também que o retorno de Cristo ocorrerá antes do milênio. Sua distinção é quanto ao momento da tribulação. Os pré-milenistas dispensacionalistas acreditam que o milênio é antes da grande tribulação (ou seja, pré-tribulacional). A visão dispensacionalista defende também um segundo retorno secreto de Cristo para reinar no milênio. Entre o primeiro retorno de Cristo e o segundo retorno há um período de 7 anos, onde exatamente nesse período irá se cumprir varias profecias inclusive o grande ajuntamento de judeus convertidos e sua evangelização em massa. Segundo esse ponto de vista, a era da igreja continuará até que, de repente, de maneira inesperada e secreta, Cristo chegará a meio caminho da terra e chamará para si os crentes: “… os mortos em Cristo ressuscitaram primeiro ; depois, nós, os vivos, os que ficarmos, seremos arrebatados juntamente com eles, entre nuvens, para o encontro do Senhor nos ares” (1Ts 4:16-17). Ao termino dos 7 anos Cristo voltará com os seus santos para reinar sobre a terra por mil anos. Depois desse período milenar haverá uma ultima rebelião que resultará na derrota final de Satanás e suas forças, e então virá à ressurreição dos incrédulos, o ultimo julgamento e do novo estado eterno sobre a terra.

A visão dispensacionalista do milênio não está somente inserida no cumprimento das ultimas coisas. O pré-milenismo dispensacionalista não esta ligada somente com a escatologia. A visão pré-milenista dispensacionalista é somente uma conseqüência de todo uma hermenêutica bíblica e sobre os eventos nela registrados.

A historia do Pré-milenismo Dispensacionalista

A visão pré-milenista dispensacionalista iniciou com os estudos de John Nelson Darby (1800-1882) e ficou popularizado nos Estados Unidos no século XX com a “Bíblia Comentada de Scofield”. O dispensacionalismo delineado por Darby e apresentado por Scorfield entende que Deus opera na humanidade de diferentes dispensações. Podemos aqui salientar também a contribuição que o Seminário de Dallas teve como precursor da interpretação pré-milenista dispensacionalista até os dias de hoje.

Teólogos que defendem o Pré-Milenismo Dispensacionalista
– Norman Gaisler
– Lewis Sperry Chafer
– Carlos Oswaldo Pinto
– John MacArthur (Pré-dispensacionalista Progressivo)

3°) O Pós-milenismo:

O prefixo pós descreve o significado do termo em relação ao milênio: a volta de Cristo será depois do milênio. De acordo com os pós-milenistas, o avanço do evangelho e o crescimento da Igreja se acentuarão de forma gradativa, de tal modo e proporção cada vez maior da população mundial se tornará cristã. Segundo Larine Boettner : Essa visão das ultimas coisas que temos do Reino de Deus esta sendo estendida pelo mundo por meio da pregação do evangelho e da obra redentora do Espírito Santo no coração das pessoas, de modo que o mundo todo acabará cristianizado e a volta de Cristo deverá ocorrer no final de um período de justiça e de paz normalmente chamado de “Milênio".
A segunda vinda de Cristo será seguida, imediatamente, pela ressurreição generalizada, o juízo geral e a introdução do céu e do inferno em sua plenitude.”

Uma característica central do pós-milenismo é o otimismo quanto as futuro de todas as coisas. O evangelho dará ao mundo uma transformação social,econômica e de bem estar espiritual na Terra que será resultado do avanço do evangelho desde a era apostólica. Os pós-milenistas assim como todos os outros não acreditam que todos serão salvos nesse período. Entretanto o os princípios e valores cristãos serão prevalecentes na Terra de modo que o pecado terá proporções mínimas. Sua duração será um longo período de tempo, mas não necessariamente mil anos. Provavelmente mais longo que mil anos literais.

Os pós-milenistas entendem também que Satanás ficará amarrado durante todo o tempo e sempre debaixo do controle de Deus. Mas ele será amarrado de uma maneira especial no inicio do milênio, de acordo com Apocalipse 20.

Muitas passagens os pós-milenistas usam como base. Muitos dos textos usados pelos pré-milenistas também são usados pelos pós-milenistas de forma que os estes acreditam no cumprimento antes da volta de Cristo. Os textos sãos: Salmos 2:8; 22:27;47;72; 86:9; Isaías 2:2-4; 11:6-9; Jeremias 31:34; Daniel 2:35,44 e Miqueias 4:1-4.



Teólogos que defendem o Pós-Milenismo

– Calvino ?
– Martin Bucer
– John Owen
– Matthew Henry
– Jonathan Edwards
– Loraine Boettner
– Iain Murray
– Kenneth Gentry

4°) O Amilênismo:

O amilenismo é a interpretação do milênio não literal antes da volta de Cristo. Os amilenistas acreditam que no final haverá um desenvolvimento paralelo tanto do bem quanto do mal, do Reino de deus e do que pertence a Satanás. A visão amilenista é a mais simples de todas as interpretações, pois descreve o milênio de Apocalipse 20.1-10 como sendo a “ Era da Igreja”. A era da Igreja (o milênio não literal) trata-se de uma era em que a influência de satanás sobre as nações sofre grande redução de modo que o evangelho pode ser pregado por todo o mundo. Aqueles que Reinam com Cristo por mil anos são os cristãos que morreram e já estão reinando com Cristo no Céu. De acordo com essa posição a presente era da igreja continuará até o tempo da volta de Cristo e que quando este voltar, haverá ressurreição tanto de crentes como de incrédulos. Os crentes terão o corpo ressuscitado e unido a novamente com o espírito e entrarão assim no estado eterno do céu para sempre.

As divergências Amilenistas.

Entre os defensores do amilênismo clássico, existem duas visões acerca do milênio. 
A Primeira defende a possibilidade de ver, nesta era, o cumprimento das passagens que falam do milênio mediante a Igreja da Terra. A segunda defende que as passagens estão sendo cumpridas pelos santos no céu agora. As duas interpretações chagam na conclusão que não haverá um Reino terreno e futuro.

O amilenismo e as Alianças

Os amilenistas acreditam que as promessas que não foram cumpridas literalmente, foram ou serão cumpridas em Cristo ou na igreja. O amilenismo defende que muitas passagens eram de modo condicional. Assim muitos amilenistas creem que os novos céus e a nova terra tem haver com a era da igreja sobre a terra.

O Amilenismo e a Igreja

A visão amilenista defende que na igreja se cumpre as promessas de Deus de maneira espiritual e serve como antítipo. A igreja então é um reino celestial espiritual que cumpre as promessas não literais do Antigo e novo testamento de forma que o novo céu e nova terra são consumadas durante a história.

A historia do Amilenismo

Entende-se que Agostinho (354-430) foi o primeiro a que deu um significado amilinista sobre o Milênio. Segundo Agostinho no livro “ Cidade de Deus”: “ durante os mil anos enquanto o diabo estiver amarrado, os santos também reinarão durante “mil anos” e, sem duvida os dois períodos são idênticos e significam o período entre a primeira e a segunda vinda”. Conservando a visão Agostiniana do Milênio os reformadores também aderiram ao amilenismo, mas diferente de Agostinho, Calvino e outros reformadores acreditavam na visão não literal do milênio. Em geral os credos reformados falam muito pouco sobre a questão do milênio, preferindo concentrar-se na ressurreição, no julgamento e na eternidade.



Alguns teólogos que defendem o Amilenismo:

– Agostinho
– Calvino?
– Louis Berkhof
– D.M. Lloyd Jones
– John Stott
-Robert B. Strimple

Conclusão

Obviamente é impossível fechar questão sobre determinada interpretação. A complexidade e a nuança do tema não nos permite excluir nenhuma das 4 principais e possíveis interpretações e logo não nos deixa ameno da responsabilidade de compreensão do que a bíblia ensina. Embora busquemos uma possível solução para este “problema” devemos ter em mente que grandes teólogos e homens de Deus divergem em sua opinião ao longo da própria história da Igreja.

Por isso o tema tem sua importância didática. Aprendemos a nos importar mais com o assunto, pesquisar mais, ter a mente mais aberta para possíveis variações do tema e assim reconhecer que o assunto demanda de nós uma responsabilidade devocional e acadêmica do apocalipse.

João começa o Apocalipse afirmando: “Feliz é aquele que lê as palavras desta profecia e felizes aquele quês que ouvem e guardam o que nela está escrito” Se o tema nos levar a ler, meditar e guardar como preciosidade todas as promessas que estão no livro, então este estudo cumpriu o seu papel na edificação.

Tiago Souza

Bibliografia
Berkhof,Louis. Teologia Sistemática – Campinas: Luz Para o Caminho Publicações,1990
Ryrie,Charles C. Teologia Básica ao Alcance de Todos – São Paulo: Mundo Cristão, 2004
Grudem, Waine A. Teologia Sistemática – São Paulo: Vida Nova, 1999
Bock, Darrell L. O Milênio – São Paulo: Vida Acadêmica, 2005
Grenz, Stanley J. Dicionário de Teologia – São Paulo: Editora Vida, 2007
BÍBLIA SAGRADA NVI