Reflexão do dia: Paulo em Gálatas - A fé que liberta
"Não existe outro Evangelho” (Gl 1:7), além do de Jesus Cristo, revelado a ele nas entranhas das relações humanas conflituosas (Gl 1:12).
O apóstolo Paulo não abre mão da verdade, porque ele sabe que a verdade dói, mas liberta. Ele não se pauta nenhum caminho cômodo ou reprodutor de mentiras e fake news que corroem as relações humanas e sociais deixando imperar a injustiça e a mentira. Paulo exige justiça como condição sine qua non para se colocar em prática o Evangelho anunciado por Jesus Cristo.
O apóstolo Paulo se entende como “servo de Cristo” (Gl 1,10), mas o que isso significa?
Existem pessoas ingênuas que afirmam: “Que bom que Jesus morreu para nos salvar!”
Como compreender esta afirmação?
Como é possível que Deus aceite uma vítima justa no lugar de um transgressor?
É justo um transgredir e outro ser punido?
Como é possível que Deus aceite os sacrifícios enquanto tais e justificar relações humanas que ferem a aliança com Deus?
É possível admitir que em um ritual macabro de derramamento de sangue possa substituir uma relação humana real de amor ?
Admitir isso não seria uma forma de driblar a famigerada ira de Deus?
Não seria tentar barganhar com Deus para se salvar?
O Deus no qual cremos, um Deus que relativiza a sua lei em prol onde a necessidade doo ser humano, um Deus solidário e libertador.
O fato de Jesus ter morrido na cruz não tira automaticamente nossos pecados.
Jesus veio nos ensinar a trilhar seus passos, ser solidário ao oprimidos e injustiçados para nos indicar o caminho a ser trilhado.
O apóstolo Paulo nos ensina que impor a circuncisão aos não-judeus e a observância à Lei moisaica não se reduz apenas à questão de observar a tradição, mas afirma que impor aos não-judeus o cumprimento das leis mosaicas era um meio de continuar garantindo a escravização do povo, retirando as condições materiais objetivas que viabilizam a liberdade.
“Deus não faz acepção de pessoas” (Gl 2:6) Deus não discrimina ninguém, mas ama a todos independente do gênero, orientação sexual, classe social ou etnia. Em determinado momento da sua vida, o apóstolo Pedro se libertou das amarras do judaísmo => “Não chame de impuro o que Deus purificou” (At 10:15) , isto é, tudo é sagrado, principalmente o profano.
Na Carta aos Gálatas, o apóstolo defende a liberdade através do Evangelho de Jesus Cristo e mostra que fé é importante, mas desde que não seja fé alienadora.
Reverendo Renato Barbosa
“Camelo que passa pelo buraco da agulha… ” – Uma tradução errada?
Todos conhecemos bem a frase de Jesus narrada por Mateus 19,24: “É mais fácil o camelo entrar pelo buraco da agulha do que o rico entrar no Reino de Deus”. Considerado as dimensões do camelo e a do buraco da agulha, é óbvio que parece uma expressão irreal. É verdade que se trata de uma figura de linguagem que sublinha um elemento difícil de acontecer, uma coisa exagerada, mas mesmo assim deveria ter algum apoio na realidade.
Muitas explicações foram dadas. A mais comum é que Jesus se refere a uma porta ou beco em Jerusalém chamado “buraco da agulha”, mas não existe nenhum fundamento para tal interpretação. Há alguns estudiosos que propõe, invés, uma solução interessante.
Sabemos das várias hipóteses que pensam que as fontes dos evangelhos, num primeiro momento, antes de ganhar a redação definitiva, eram em aramaico, língua falada por Jesus. Os evangelhos, invés, chegaram até nós em grego. Alguns dizem que a passagem do aramaico das fontes para o grego dos atuais evangelhos provocou alguns erros de tradução e uma dessas seria o “camelo”.
Em aramaico existem duas palavras muito parecidas, com significados diferentes:
- Gamai: camelo
- Gamia: corda da rede dos pescadores
A interpretação dos críticos é que quem escreveu o grego, o texto definitivo do evangelho, leu errado a palavra aramaica, isto é, leu “gamai” invés de “gamia”. Nesse caso a frase correta dos evangelhos seria: “é mais fácil uma corda da rede dos pescadores passar pelo buraco da agulha do que um rico entrar no reino dos céus”.
Essa hipótese adquire uma certa autoridade se consideramos o ambiente em que foi usada, isto é, Jesus estava lidando com um grupo de pescadores, que entendia bem de cordas, de redes, mas nada de camelos.
Em relação à interpretação, normalmente se sublinha o carácter da hipérbole, uma coisa exagerada, difícil de acontecer. Isso continua valendo, mesmo se admitimos a hipótese explicada. E o cerne da mensagem continua o mesmo: é preciso ser desapegado dos próprios bens para abraçar o Reino de Deus.
Por Luiz da Rosa
Curiosidades sobre o Livro de Amós - o Profeta dos Oprimidos
"O discurso de Amós menciona, talvez, um passado histórico não identificável nem pela forma e nem pelo conteúdo do texto. As pragas do tempo do Êxodo feriam o Egito, não Israel, e de uma maneira diferente da relatada no livro de Amós capítulo 4. Além do mais, as tais “pragas” eram no mundo antigo, e são ainda nas culturas rústicas, o resultado obrigado de situações críticas naturais ou políticas: a fome é o resultado de toda estiagem prolongada e peste nas plantações, assim como a morte dos jovens (Am 4,10) é o efeito de toda batalha militar, no mundo antigo e moderno",
Gilvander Luís Moreira, frei e padre , mestre em Exegese Bíblica e professor de Teologia Bíblica.
Provavelmente as composições mais antigas do livro do profeta Amós, na Bíblia obviamente (Amós 1-6; 7-9) datam de meados do século VIII a.C., e surgiram como literatura de protesto e resistência. “O acento principal da mensagem de Amós está na crítica social e no anúncio de um juízo iminente de Deus na história, bem como na tênue, mas clara exigência do restabelecimento da justiça como alicerce das relações sociais.
Amós é um profeta precursor, radical, exemplar e paradigmático. A profecia de Amós é, em certo modo, um divisor de águas na história da profecia no sentido de que instaura um novo jeito de ser profeta. O livro de Amós está organizado em duas grandes unidades literárias: I) Am 1-6: Palavras e II) Am 7-9: Visões.
Am 4,4-13 nos ajuda a refletir sobre três aspectos fundamentais da ética profética, intimamente entrelaçados. Esses são: a) a concepção de pecado em relação ao culto; b) em relação à história; c) e os limites de uma possível reconciliação com Deus. A pergunta que se coloca na base e no fim do estudo de Am 4,4-13 é: Trata-se de um anúncio de punição in extremis diante da incapacidade de Israel de reagir, ou de uma velada promessa de perdão? Ou existe uma outra interpretação possível?
A declaração final de Deus solidário com os pisados e libertador dos oprimidos - ao ser humano que fecha a unidade Am 4,4-13 constitui-se quase como uma nova revelação do Sinai, que deve por fim ao conflito entre o ser humano e a divindade, em favor do ser humano. As punições didáticas deixam lugar a um esclarecimento que abre o coração do ser humano para que veja o conjunto da sua história e possa render-se conta do seu processo de endurecimento.
Am 4,4-13 evoca, portanto, uma situação na qual há certa semelhança com aquela do relato das pragas do Egito, mas não é obviamente, a recordação daqueles fatos. O discurso de Amós menciona, talvez, um passado histórico não identificável nem pela forma e nem pelo conteúdo do texto. As pragas do tempo do Êxodo feriam o Egito, não Israel, e de uma maneira diferente da relatada no livro de Amós capítulo 4. Além do mais, as tais “pragas” eram no mundo antigo, e são ainda nas culturas rústicas, o resultado obrigado de situações críticas naturais ou políticas: a fome é o resultado de toda estiagem prolongada e peste nas plantações, assim como a morte dos jovens (Am 4,10) é o efeito de toda batalha militar, no mundo antigo e moderno.
Às pragas ou punições descritas se reúnem ainda a menção a Sodoma e Gomorra. O discurso de Amós 4 quer, portanto, dar conta de toda a antiga história de Israel, também de Israel patriarcal, para aplicá-la a uma nova situação.
Um ponto particular de relação com o Êxodo é a presença do refrão “mas não retornastes a mim” que estrutura o texto de Amós 4,4-13. Assim, como no relato das pragas o endurecimento do coração do Faraó é o motivo estruturante que faz aumentar as pragas.
No relato do Êxodo, um primeiro grupo de textos, atribuídos tradicionalmente à fonte Javista (J), apresenta de fato Faraó como responsável pelo seu próprio endurecimento, como havia predito Deus (Cf. Ex 7,14.22; 8,11.15.28; 9,7.34). O outro grupo de textos (os chamados “heloístas”) atribui a obstinação ora a Faraó (Ex 9,35) ora a Deus mesmo (Ex 10,20.27). O relato sacerdotal (P) o atribui habitualmente a Javé.
Esta diversidade de concepção no atribuir a responsabilidade pelo pecado aparece também em outros textos fora do Êxodo, com diferente vocabulário e problemática. Em 2º Samuel 24,1, Javé é o responsável direto pelo pecado de Davi devido ao recenseamento. Segundo 1º Crônica 21,1 a responsabilidade é, ao invés, de Satanás. O verbo hebraico usado é o mesmo: swt (= incitar, seduzir).
Tanto em Êxodo como em Am 4,4-13 se coloca um grande problema exegético e teológico: É possível e legítimo que Deus continue a aplicar punições que levam a um endurecimento sempre crescente? Não se comporta Javé assim como o pai que exagera, com sua punição, ao seu filho e força-o a se rebelar (Cf. Efésios 6,4)?
É necessário reconhecer que por trás dos textos bíblicos de endurecimento há o mistério da liberdade humana e da “onipotência” divina. Em relação a Deus, há uma consciência profética que as obras e a Palavra de Deus não podem permanecer sem efeito (Cf. Isaías 55,11), mas é sempre eficaz (não eficiente). Se não produzem imediatamente a conversão, devem amadurecer o sujeito para uma nova prova, o que, em última análise, não exclui a possibilidade de conversão.
Em relação à pessoa punida, há uma consciência do fato que a exortação à conversão, quando não ouvida, se torna uma condenação. Isto é, nada mais, nada menos, que a dinâmica das relações interpessoais. Quando duas pessoas percebem uma mútua existência começa uma comunicação humana, que pode progredir, parar ou, eventualmente, morrer. Mas enquanto existe, cada ação e reação levam à evolução ou diminuição daquela relação. Todo ato (ou omissão) nas relações interpessoais somam e cultivam a relação ou a empobrece descultivando-a. Nenhuma atitude fica neutra.
De modo semelhante, na relação do ser humano com Deus, cada ação que não melhora a relação, a piora, mas jamais a deixa igual. Se não se aceita um convite à conversão, como uma oferta de amizade, o recusa. Por um lado, esta recusa tornará mais difícil que aconteça um novo convite.[3] E de outra parte quem recusou dificilmente voltará atrás para aceitar uma nova oferta, o que implicaria em reconhecer o erro precedente, o que é mais difícil.
Em relação aos profetas e profetisas, este processo se explica na medita em que os/as “intérpretes de Javé” sabem do paradoxo da missão deles/as. Os profetas e profetisas sabem que a palavra profética conduz, às vezes, à conversão de alguns poucos, mas na maioria das vezes leva ao endurecimento de muitos. Os oráculos de condenação no futuro, pronunciados com absoluta segurança, implicam nos profetas a consciência que a advertência seria inútil.
A consciência que os profetas e profetisas têm das três realidades descritas acima se apresenta, de modo muito claro, em Isaías 6,9-11: “Então disse ele: Vai, e dize a este povo: Ouvis, de fato, e não entendeis, e vedes, em verdade, mas não percebeis. Engorda o coração deste povo, e faze-lhe pesados os ouvidos, e fecha-lhe os olhos; para que ele não veja com os seus olhos, e não ouça com os seus ouvidos, nem entenda com o seu coração, nem se converta e seja sarado. Então disse eu: Até quando Senhor? E respondeu: Até que sejam desoladas as cidades e fiquem sem habitantes, e as casas sem moradores, e a terra seja de todo assolada”.
Em Am 7,14, o profeta Amós se recusa a ser considerado profeta, nos termos do sacerdote Amasias, cúmplice de um poder político opressor. Amós se define como “vaqueiro” e cultivador de sicômoros. Em Am 7,15, Amós parece ser um pastor que cuida do rebanho miúdo (ovelhas e cabras), mas não um vaqueiro. Em Am 7,10-17 não há a intenção primeira de descrever pessoalmente a profissão do profeta, mas enfatiza o fato de que Amós foi retirado da sua vida precedente, do seu mundo, das preocupações domésticas para proclamar a Palavra de Deus.
Am 7,10-17 quer legitimar o conteúdo da profecia de Amós e ajudar a comunidade superar todos os preconceitos que possam existir contra o profeta por causa da sua origem humilde, como se fosse um “nordestino”, um sem-terra, um sem-casa, um menor de rua, um portador de HIV, um homossexual etc. O relato de Am 7,10-17 quer nos dizer que a profecia vem da margem, da periferia, do meio dos marginalizados e excluídos. São estes, por excelência, os “intérpretes de Javé”.
Na Bíblia este “gênero” é utilizado para descrever de maneira diferente as vocações de Moisés, Gedeão, Eliseu e Saul. Mas uma estreita relação se encontra em 2º Samuel 7,8. Natã transmite a Davi a mensagem de Javé: “Eu te tirei das pastagens, pastoreavas as ovelhas”. O elemento que caracteriza estas situações não é o fato do convocado pertencer a um grupo, mas, ao contrário, o fato dele ser um “de fora”, um excluído. Assim Am 7,14 quer exprimir a distância de Amós das formas institucionais da profecia e dos profetas “da corte”.
O relato do confronto entre o sacerdote Amasias e Amós (com a implicada presença do rei) oferece a justificação da decisão de Javé. O povo não somente não ouviu as diversas palavras transmitidas pelo profeta Amós, mas decidiu silenciá-lo, expulsando-o para sua terra. Já não há nada mais a esperar senão o fim definitivo, e diante desse resta somente a lamentação. O profeta anuncia a necessidade de conversão; pede perdão a Deus pelo povo; pede para parar a punição. O rei (e a monarquia) e o Templo expulsam o profeta, silenciando-o. O povo sofrerá muito mais. Ai de um povo que não escuta seus profetas e profetisas, e pior ainda, que os persegue, expulsa e os silencia.
A perícope de Am 7,10-17 revela a interpretação que setores da classe dominante tinham do conteúdo da profecia de Amós. Aos olhos da elite, o profeta é um “conspirador”, interessado em “golpe de estado”. Para Javé e o povo empobrecido Amós é um profeta, porta voz do Deus da vida para todos e tudo. Para a elite ele é um “subversivo”, um agitador.
Em Am 4,1-3 temos a seguinte profecia:
“OUVI esta palavra, vacas de Basã, que estais sobre o monte de Samaria, que oprimis os fracos, que esmagais os excluídos, que dizeis aos vossos senhores: “Trazei-nos o que beber!”. O Senhor Javé jurou, pela sua santidade: sim, dias virão sobre vós, em que vos carregarão com ganchos e a vossos descendentes com arpões (de pesca). E saíreis pelas brechas que cada uma tem diante de si, e sereis empurradas em direção ao Hermon, oráculo de Javé”.
Segundo uma interpretação tradicional, Am 4,1-3 seria uma investida do profeta Amós contra as mulheres ricas de Samaria, designadas como “vacas de Basã”, mulheres de personagens importantes, que ocupam o tempo em luxuosos banquetes, e ao mesmo tempo são responsáveis pela opressão e exploração dos empobrecidos. A imagem de um banquete só de madames é, no mínimo, algo curioso em uma sociedade reconhecidamente machista e patriarcal, assim como atribuir às mulheres a responsabilidade pela opressão e pela injustiça.
A região de Basã, como o Líbano e o Carmelo, é famosa pela fertilidade do solo. A tristeza causada pela punição divina se manifesta na debilidade do Líbano, do Basã, do Carmelo e do Saron (Cf. Isaías 33,9). Ao contrário, a generosidade divina se expressa no nutrimento do povo com a “manteiga das ovelhas e dos touros de Basã” (Cf. Deuteronômio 32,14). O anúncio messiânico, com o qual se conclui o livro de Miquéias, inclui a promessa de um pasto abundante “em Basã e em Galaad, como nos dias antigos (Cf. Miquéias 7,14). No ambiente de louvor do Salmo 68 o “Basã” são os montes (Sl 68,16) que testemunham, junto com o Sinai e a natureza, a grandeza das obras de Javé. Logo integrar “Basã” em uma imagem depreciativa é algo estranho ao uso corrente de “Basã” na Bíblia.
De “vaca de Basã” não se fala em nenhum outro lugar no Primeiro Testamento da Bíblia. As montanhas de Basã são famosas pelos seus touros, cabritos e carneiros (mas não vacas; cf. Dt 32,14). Por isso os touros de Basã podem ser imagens dos inimigos poderosos (cf. Salmo 22,13 e, sobretudo, Ezequiel 39,18).
A expressão “vacas de Basã” adquire um sentido mais verdadeiro dentro da cultura bíblica se o termo “vacas” não for utilizado em relação a mulheres, mas a homens, aqueles que quiseram ser como os touros de Basã, pela força deles, autoridade e dignidade se tornaram “vacas”, com as conotações depreciativas que as formas femininas podem ter no Primeiro Testamento.
Neste contexto, os “seus senhores” (Am 4,1b, com sufixo masculino) se referem provavelmente não aos “maridos”, como propõem algumas traduções, um uso pelo qual não se tem nenhuma outra ocorrência, mas refere-se a uma pessoa de mais autoridade (política). “Senhor”, além do freqüente uso como título divino, se refere a Acab (2 Reis 10,2.3.6), ao Faraó (Gênesis 40,1), ao Rei da Babilônia (Jeremias 27,4), e em casos isolados a várias pessoas: “outros senhores...” (Isaías 26,13).
Na profecia de Amós está “uma crítica veemente e contundente aos agentes e mecanismos de exploração e opressão dos camponeses empobrecidos sob o governo expansionista do rei Jeroboão II e sob as condições de um incremento de relações de empréstimos e dívidas entre pessoas do próprio povo no século VIII a.C.”. Em outros termos, o profeta Amós não apenas critica pessoas corruptas, mas questiona também de modo muito forte o sistema gerador de pessoas corruptas. Não somente as mazelas pessoais estão na mira do “camponês” que entrou para a história como um grande profeta. Amós tem consciência de que o problema fundamental da injustiça reinante na sociedade não é fruto somente de fraquezas e ambigüidades pessoais, mas tem como causa motriz estruturas sócio-econômico-político-cultural e religiosas que engrenam uma máquina de moer pessoas. Na mira do profeta Amós também estão relações comerciais que causam endividamento, aprisionam pessoas e escravizam, retirando a liberdade de ser pessoa humana.
Além das denúncias sociais, a profecia de Amós destaca-se com o anúncio de um juízo iminente de Javé na história do seu povo. Amós inverte as expectativas quanto a um tão sonhado “dia de Javé” (Am 5,18-20). Este não será mais uma “ideologia de segurança político-religiosa” pelos fortes de Israel. A perversão da justiça para os pobres, a opressão dos empobrecidos e a exploração das pessoas mais enfraquecidas clama pelo juízo divino. O “dia de Javé” será um “dia mau” sobre os fortes de Israel, sobre o estado tributário, suas instituições e seus agentes.
Amós critica com coragem a “corrida armamentista” de Israel. Ele anuncia que serão desmanteladas as forças militares dos estados vizinhos (Amós 1,5.8b.14b; 2,2b) e sobretudo de Israel (Amós 2,13-16; 3,11b; 5,2-3; 6,13-14).
O profeta Amós denuncia duramente também as instituições religiosas que estão justificando o processo de extorsão de tributos da população camponesa (Am 4,4-5; 5,21-23). Pelo conluio com a opressão econômica a religião oficial também será dizimada (templos) e seus agentes (Am 5,27; 7,9; 9,1).
“Odeiem o mal e amem o bem: restabeleçam no portão a justiça!” (Am 5,15). “Aqui está a exigência positiva por excelência na profecia de Amós. Os israelitas são conclamados a reconstruir as relações sociais baseadas na justiça e no direito (mishpat / sedaqah – em hebraico). Só assim será possível escapar do juízo vindouro anunciado. O futuro de um “resto” passa pela prática de Justiça”. O juízo abre caminho para a justiça. A presença dos profetas e profetizas no meio do povo deixa Javé livre de qualquer responsabilidade diante da punição que o povo merece. Não precisa nem explicitar a atualidade da profecia de Amós. Que cada leitor/a faça as atualizações necessárias.