Reflexão do Dia - Evangelho Segundo Mateus 26:14 a 27:66

A leitura de hoje é um episódio popularmente conhecido como a "paixão de Cristo" e faremos a leitura a partir do relato do evangelista Mateus. Dada a extensão do texto, 128 versículos, focaremos na mensagem global e, na medida do possível, enfatizarei os aspectos mais relevantes destacando alguns detalhes que pertencem exclusivamente ao relato de Mateus.

Os relatos da paixão e da morte de Cristo constituem o núcleo de base do relato dos evangelhos. Embora o nosso foco nesse ano seja especificamente o relato de Mateus. Um detalhe interessante é que as primeiras páginas escritas dos livros que hoje conhecemos como os 4 evangelhos, foram exatamente as narrativas da paixão e morte de Jesus, indicando que as primeiras comunidades cristãs giravam em torno da mensagem do Cristo Ressuscitado.

Com as primeiras perseguições das autoridades romanas e também dos líderes religiosos judeus, a morte se tornava cada vez mais presente na igreja primitiva. Para quem não tinha convivido com Jesus, tornava-se cada vez mais difícil perseverar na fé e, para animar e fortalecer uma comunidade ameaçada pela perseguição, nada melhor do que reconstruir a história da perseguição e morte de Jesus, enaltecendo sua fidelidade aos propósitos do Pai e sua resistência contra o sistema.

Tendo acesso hoje aos textos inteiros dos evangelhos, percebemos que a morte de CRISTO foi uma consequência da mensagem do Reino, que nada mais era que uma alternativa aos sistemas sistemas vigentes, político e religioso. Durante a sua trajetória entre os homens, Jesus praticou e pregou o que a religião e o sistema político da época não aceitavam: o amor ao próximo, a justiça social, a gratuidade nas relações, o perdão ilimitado, o cuidado com os mais necessitados, a solidariedade, a acolhida aos excluídos e marginalizados. Uma vida marcada por estas características não poderia ter outro fim senão a cruz, a pior das penas aplicadas na época, não foi predestinação e nem acidente, mas consequência de uma trajetória marcada pelo inconformismo diante das atrocidades do sistema.
Jesus não se adequou aos padrões de comportamento da época: não foi um cidadão exemplar, como exigia o poder romano, nem um devoto fiel, como exigia a religião judaica, pois sua obediência e fidelidade estava toda voltada para o Pai do céu. Cristo de nazaré jamais participaria ou convocaria um jejum para tentar alavancar a popularidade do imperador.
Assim, a morte trágica de Jesus, foi consequência de uma inteira existência marcada por uma opção radical pelas causas do seu Pai, a quem foi fiel e obediente até às últimas consequências. Durante seu ministério na Galileia, houve conflitos doutrinais com os fariseus guardadores da lei e outros grupos, mas é em Jerusalém que as disputas passam do campo doutrinal para a esfera do poder.

"E, quando comiam, Jesus tomou o pão, e abençoando-o, o partiu, e o deu aos discípulos, e disse: Tomai, comei, isto é o meu corpo.
E, tomando o cálice, e dando graças, deu-lho, dizendo: Bebei dele todos;
Porque isto é o meu sangue, o sangue do novo testamento, que é derramado por muitos, para remissão dos pecados.
E digo-vos que, desde agora, não beberei deste fruto da vide, até aquele dia em que o beba novo convosco no reino de meu Pai.
E, tendo cantado o hino, saíram para o Monte das Oliveiras."
Mateus 26:26-30 

⇒⇒ A páscoa, como sabemos, é a festa em que os judeus faziam memória da libertação da escravidão do Egito, tinha como ponto alto a ceia pascal, na qual comia-se o cordeiro imolado, símbolo da festa. Ciente de que era a sua última, estando à mesa com os discípulos, Jesus mesmo se apresenta como cordeiro, doando a sua existência.

"Mas tudo isto aconteceu para que se cumpram as escrituras dos profetas. Então, todos os discípulos, deixando-o, fugiram." Mateus 26:56 
 ⇒⇒ Os discípulos ficam com medo e frustrados ao perceber que o projeto de Jesus não corresponde às suas expectativas. São os mesmos que, no início do Evangelho, deixaram barco, família, redes e até coletoria de impostos para seguí-lo. Agora, é a Jesus que eles abandonam. É uma advertência aos cristãos e, ao mesmo tempo, um consolo: deve haver resistência e força para não desistir, mas sendo composta de seres humanos, a comunidade cristã será sempre passível de medos e contradições.

O duplo julgamento de Jesus, um religioso diante do sinédrio (26:57-68), outro político diante de de Pilatos (27:11-26), mostra a covardia e a hipocrisia da união de forças hostis(Estado e Igreja) quando tem um inimigo em comum, pois os poderes romano e judaico não se suportavam. Dois poderes viciados na corrupção, no suborno e na mentira, mantinham um relacionamento de conveniência, tendo o povo pobre e oprimido como alvo de suas cobiças.

"Então Pilatos soltou-lhes Barrabás, mandou açoitar Jesus e o entregou para ser crucificado.
Então, os soldados do governador levaram Jesus ao Pretório e reuniram toda a tropa ao seu redor.
Tiraram-lhe as vestes e puseram nele um manto vermelho;
fizeram uma coroa de espinhos e a colocaram em sua cabeça. Puseram uma vara em sua mão direita e, ajoelhando-se diante dele, zombavam: "Salve, rei dos judeus! "
Cuspiram nele e, tirando-lhe a vara, batiam-lhe com ela na cabeça.
Depois de terem zombado dele, tiraram-lhe o manto e vestiram-lhe suas próprias roupas. Então o levaram para crucificá-lo.
Ao saírem, encontraram um homem de Cirene, chamado Simão, e o forçaram a carregar a cruz.
Chegaram a um lugar chamado Gólgota, que quer dizer Lugar da Caveira,
e lhe deram para beber vinho misturado com fel; mas, depois de prová-lo, recusou-se a beber.
Depois de o crucificarem, dividiram as roupas dele, tirando sortes." Mateus 27:26-35 
 ⇒⇒ A cruz é decretada como pena exemplar. Justamente na páscoa, a religião oficial não hesita em ser conivente com a condenação de um inocente e justo. Os líderes religiosos, mais do que nunca, colocaram a Lei e a doutrina acima da vida. Em meio ao suplício e ao abandono dos seus discípulos, Jesus faz prevalecer as convicções de seguir até o fim. Aquele projeto de vida nova, com justiça, igualdade e amor sem distinção não poderia ser jogado fora de repente. O rosto amoroso do Pai que ele veio revelar não poderia ser escondido.

E o centurião e os que com ele guardavam a Jesus, vendo o terremoto, e as coisas que haviam sucedido, tiveram grande temor, e disseram: Verdadeiramente este era o Filho de Deus. Mateus 27:54 
⇒⇒ A cruz veio como consequência de uma vida toda marcada pelo amor. E, nele, ao invés de ser simplesmente sinal de condenação, a CRUZ se tornou sinal de salvação. Na cruz ele ele foi escarnecido e humilhado, mas também reconhecido em sua mais profunda identidade.

"E eis que o véu do templo se rasgou em dois, de alto a baixo; e tremeu a terra, e fenderam-se as pedras;" Mateus 27:51 
 ⇒⇒ O rasgar-se do véu do santuário significa a falência completa da religião e do sistema político que tinham acabado de matar Jesus. A cortina ou véu do santuário marcava a divisória do espaço sagrado do templo: somente os sacerdotes podiam ultrapassar a divisória demarcada pelo véu. Jesus, mesmo morrendo, mostra sua força; consegue abolir as divisões e rótulos impostos pela religião. De agora em diante, conhece a Deus quem segue o Seu Filho.

Jesus abraçou o projeto de tornar o Reino de Deus possível e acessível a todos. Glória a Deus!!!

Paz, graça e bem,
Renato Barbosa

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