A bíblia do mar morto

 

Fragmentos de um manuscrito religioso de dois mil anos encontrados em Israel refazem a história do início do cristianismo

Crédito: Ammar Awad

PERGAMINHO (Crédito: Ammar Awad)

TESOUROS A cesta mais antiga do mundo e restos de objetos pessoais: luz sobre o cotidiano da época (Crédito:MENAHEM KAHANA)

A descoberta de uma coleção de objetos históricos feita por um grupo de arqueólogos israelense e divulgada na terça 16 é a mais importante dos últimos 60 anos. Entre tesouros que remetem ao início do cristianismo, as peças encontradas estabelecem um vínculo entre o povo judeu e a região. “Os pergaminhos comprovam a presença judaica desde o período do Império Romano”, afirma Samuel Feldberg, pesquisador do Centro Dayan da Universidade de Tel Aviv. Na “Caverna do Horror”, na região de Nahal Hever, foram encontrados, dezenas de fragmentos de textos bíblicos que integram a coleção de manuscritos judeus. A inóspita caverna fica no Deserto da Judeia, no Mar Morto, mas os trabalhos de escavação se estenderam até a fronteira com a Cisjordânia, ocupada por Israel desde 1967. O professor Feldberg explica que a “Caverna do Horror” ganhou essa alcunha devido às ossadas encontradas lá.

O novo trabalho arqueológico ainda precisa ser desvendado a contento, uma vez que os documentos encontrados estão escritos em grego arcaico. Apenas a palavra “Deus” foi identificada em paleo-hebraico, idioma do período do primeiro Templo de Salomão, datado do século 11 antes de Cristo. “Era o período conhecido como a ‘Revolta de Bar Kokhba’, quando rebeldes judeus se revoltaram contra a destruição do templo pelos romanos e fugiram para as cavernas”, explica Feldberg. Esse grupo de judeus, no entanto, acabaria morrendo de fome.

Divulgação

No rolo recém-revelado há partes do livro dos Doze Profetas Menores, ou seja, os 12 últimos livros proféticos do Antigo Testamento. Até agora tinham sido reconstruídas onze linhas do texto grego traduzido de Zacarias, bem como versículos de Naum. Eles se juntam a outros nove fragmentos já conhecidos que foram descobertos em 1953. Para realizar o trabalho de verificação da área foram utilizados drones; para alcançar os desfiladeiros, os arqueólogos usaram técnicas de escalada, como o rapel.

A cesta de dez mil anos

Os arqueólogos apresentaram uma cesta de fios trançados de 10.500 anos em perfeito estado de preservação. Acredita-se que o utensílio é do período Neolítico pré-olaria e seja capaz de comportar um volume de até 100 litros. A cesta é tida como a mais antiga do mundo. “O clima árido e desértico contribui para a conservação dos materiais arqueológicos”, afirma Sónia Cunha, arqueóloga da HV Arqueologia, Conservação e Gestão. Também foi encontrado um esqueleto mumificado de uma criança em posição fetal com cerca de seis mil anos. “Ela tem o corpo inteiro envolvido com um pano, assim como um pai cobre seu filho com um cobertor”, disse o historiador Runit Lupu.

Entre os achados estão pontas de flechas e lanças, tecidos, sandálias, pentes – usados para enfeitar e no combate aos piolhos. Todos esses objetos jogam luz sobre o cotidiano dos judeus que se abrigaram nas cavernas para fugir do domínio romano. Os arqueólogos desvendaram ainda outro esconderijo, também do período da ‘Revolta de Bar Kokhba’, cheio de moedas desenhadas com símbolos judeus, como a harpa e a tamareira. Como o local é alvo constante de saqueadores de relíquias arqueológicas, o governo israelense agiu rapidamente para chegar antes dos bandidos ao local. Graças à nova descoberta, “uma quantidade maior de recursos será alocada para novas operações”, garantiu Israel Hasson, diretor geral da Autoridade de Antiguidades do país. “Precisamos garantir que vamos recuperar todo esse tesouro, incluindo peças que ainda não foram descobertas, antes que os ladrões o façam”, disse.

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